quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

PRÓXIMA PARADA...


Não quero nesse texto entrar no mérito de as produções cinematográficas nacionais ficarem concentradas nas mãos de poucos ... o fato - não justificável para o exposto, evidentemente – é que gosto muito dos trabalhos de Bruno Barreto e Fernando Meirelles. Ontem assisti “Ultima parada 174” e, recentemente, o “Ensaio sobre a Cegueira” dos respectivos diretores. É para aí que conduzirei as ilações.
O Ensaio foi um livro que marcou intensamente minha vida, um soco no estômago tão forte quando li que já fui anestesiada para a catarse cinematográfica. Mesmo assim digo com todas as letras: o filme é muito bom.
Parece ficção, mas quando vi as imagens das destruições desse ano em Santa Catarina me veio à mente a cena do caos da cidade dos cegos do filme. Cenário. Mas e o comportamento humano? Sim, “essa coisa que não tem nome é o que somos” não é cenário, não é ficção. O Brasil é cego e não enxerga suas crianças, seus doentes, seus infratores nas ruas, presídios e febens, suas favelas, sua falta de educação, sua vergonhosa mídia-espetacular.
Por isso acho que o filme de Bruno Barreto tocou-me um pouco mais profundamente como espectadora de cinema. Foi o mesmo soco de quando li o “Ensaio sobre a cegueira” em 2000, no mesmo ano em que pela televisão, ao vivo, vi o seqüestro do ônibus 174, diga-se de passagem.
E diga-se de passagem, o que assisti naquela época me pareceu muito com o que assisti ao vivo meses atrás, quando ocorreu o seqüestro de duas adolescentes. Vi a história virar uma novela de triste fim, como vi a novela de uma criança que foi jogada de um edifício e de outra criança que foi encontrada dentro de uma mala na rodoviária da minha cidade. Não é ficção, é 2008.
E não era ficção a Chacina da Candelária, que vi no noticiário quando ainda era uma adolescente e me marcou profundamente. Lembro daquela época, marcado pelos “Cs”: Corumbiara, Candelária, Carajás, Carandiru. Triste aliteração. Lembro de todos esses e outros absurdos citados, de tuod o que ocorreu em 2008 e que evitei escrever a respeito no blog, pois a mídia já havia dilacerado e exposto em praça pública.
Mas hoje vim falar, a próxima parada é 2009 e não posso me calar.
Vim falar que toca em mim a relação ficção-realidade que se constrói no mundo-imagem de hoje. Me revolta o simulacro porque o que vale é o ibope, seja da novela, seja da miséria humana. O seqüestrador é o que está em foco, não importa se herói ou bandido. As crianças maltratadas não levaram a discussão da infância no Brasil. O importante é a repercussão que causa a notícia, nunca a causa ou a solução.
E ninguém pergunta o que causa a notícia... Cadê a reflexão acerca da desigualdade social, dos roubos no congresso, no senado, da vergonha da saúde, educação, das estradas do país, do abuso que pago de impostos e que nunca retornam nessas melhorias?
Enquanto não vejo reação na realidade acredito na arte, ainda. O cinema, a literatura, a música, o teatro...o que traz a poesia ao que é dor, que leva ao mínimo de reflexão, ou ao menos à catarse. Diferenças sutis e sinestésicas: a sensibilização e o sensacionalismo. No mínimo “A day in the life”.

11 comentários:

Fernando Santos (Chana) disse...

Olá Juliana, Belo texto que reflete a crise da sociedade Capitalista....
Beijos

João Moreira disse...

Olá querida,
Uma preocupação actual e o mais triste é que acho que é para agravar porque quanto maior for a desigualdade maior vai ser as agressividades e as revoltas. Tema muito actual e pertinente, infelizmente.
Fica bem
Beijos perfumados

Salve Jorge disse...

Próxima parada
Nesse caminho contrário à alvorada
É o nada
Sem estrada
Sem passarada
Sem riso da meninada
Só nada
Realidade obliterada
Com todos assistindo da sacada
O degringolar dessa imensa presepada
Que há de ser muito bem noticiada
Na mídia escrita e falada
E há de ser assim anunciada
"Finda a raça humana desumanizada..
Mas agora uma palavra dos nossos patrocinadores..."

Olavo disse...

Oi querida obrigado pela força..tem um selo para vc lá no blog..
beijão.
Olavo

Luís Mendes disse...

Vivemos num meio-social onde todos nós somos "estrangeiros", e quase nem nos conhecemos a nós próprios.

Gostei muito desta abordagem.

Bjs

Juliana Lira disse...

Oi Juliana

Não assisti os filmes ainda,mas fiquei com muita vontade de ve-los depois de sua postagem.

Mil beijos

Fragmentos Betty Martins disse...

.querida________Ju









FESTAS FELIZES:)_______MUITA





.PAZ_____para o mundo

.SAÚDE______para todos nós

.MUITO AMOR_____no coração de cada "homem"


.UM GRANDE SORRISO_____no rosto de cada criança

.UM OLHAR PARA CADA IDOSO____e ver uma fonte de sabedoria_______...



._________e que se diga_____




"FESTAS FELIZES" TODOS OS DIAS:))





beijO______ternO

com amizade

CABRA CEGA: disse...

Assino embaixo. E reflito bastante. E faremos muito.

. fina flor . disse...

linda, passo para deixar um beijo domingueiro.

MM.

>>> se eu disser que não gostei do filme você briga comigo? rs*

Sr. Despedaça Corações disse...

"I read the news today oh, boy
Four thousand holes in blackburn, lancashire
And though the holes were rather small
They had to count them all
Now they know how many holes it takes to fill the albert hall
I'd love to turn you on"

I'd love to turn you on.

Roney Maurício disse...

Ei Ju,
também me recordo de todos esses episódios dramáticos, que inspiram revolta momentânea, depois do jantar, antes da novela...
E de muitos outros, não esqueço...

Hoje, cumpre esse papel o desesperado desabafo do pai de uma criança, metralhada no Rio, por um bandido fardado e que foi escandalosamente inocentado do crime cometido. Diz o pai, entre patético e atônito: "sim, ele cumpriu o dever de matar o meu filho..." E assim, entre patéticos e atônitos, reagimos, os que ainda conseguem reagir.

Mas não me lembro de ler muita gente tocar nesse tema com tanta elegância formal, justeza e sobriedade. É por aí, moça (até por falta de outro caminho...).